Desembargadores do TJ-PR anulam condenações no caso Evandro após 29 anos; réus são absolvidos em novo julgamento.

Os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná anularam as condenações dos quatro acusados de matar o garoto Evandro Ramos Caetano, de seis anos de idade, em 1992, na cidade de Guaratuba, no litoral do Paraná. O novo julgamento, que terminou com a absolvição dos réus, ocorreu nesta quinta-feira (9), durante a revisão criminal realizada a pedido da defesa dos réus.

Após mais de quatro horas de sessão, os desembargadores absolveram Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira por três votos a favor e dois contrários. O processo integral tem cerca de 152,5 mil páginas, incluindo cinco julgamentos.

O primeiro julgamento durou 34 dias e ficou conhecido como o julgamento do tribunal do júri mais longo da história brasileira. Nele, Beatriz e sua mãe, a ex-primeira dama de Guaratuba, Celina Abagge, foram julgadas e inocentadas da acusação de encomendar a morte de Evandro para a realização de um suposto ritual satânico – conclusão apontada pela Polícia Militar em 1992 e posteriormente corroborada pelo Ministério Público estadual, que acusou a realização de um “ritual de sacrifício”.

O relatório divulgado em 2021 pelo grupo de trabalho criado pelo governo paranaense mostrou que os cinco julgamentos anteriores ocorreram em 1998, 1999, 2004, 2005 e 2011.

No primeiro julgamento, Beatriz foi condenada a 21 anos de prisão em 2011, mas cinco anos depois, a Justiça lhe concedeu o perdão da pena. A ex-primeira dama Celina não foi mais levada a julgamento, pois já tinha mais de 70 anos e, portanto, seu crime foi considerado prescrito.

Os demais réus, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira, começaram a ser julgados em 1999, mas o julgamento foi interrompido e concluído em 2004, quando os três foram condenados. Os dois primeiros cumpriram suas penas, enquanto Ferreira morreu na prisão, em 2011, devido às complicações de um câncer. Outras duas pessoas acusadas foram inocentadas em 2005.

Em março de 2020, o jornalista Ivan Mizanzuk tornou públicos áudios que reforçaram a tese de que policiais torturaram os réus para que assumissem ter matado Evandro. As gravações obtidas pelo jornalista foram divulgadas na série que o podcast Projetos Humanos, de Mizanzuk, dedicou ao caso. Baseados nos áudios divulgados por Mizanzuk, os advogados de Davi Soares e Osvaldo Marcineiro pediram a revisão das sentenças proferidas anteriormente.

Para o relator do caso, o desembargador Miguel Kfouri Neto, “as novas fitas, que acabaram instruindo o pedido revisional”, e às quais “a defesa não tinha tido acesso” durante os primeiros julgamentos, deveriam ser submetidas a novas perícias.

“Continuo entendendo que esta fita deveria ser objeto de uma perícia oficial para que pudéssemos verificar a sua autenticidade”, disse o magistrado, apontando que, no processo, há antigas anotações em que um perito aponta que, em pelo menos dois momentos da gravação, há evidências de que houve “descontinuidades compatíveis com edições da fita”. Contudo, segundo o próprio desembargador, o mesmo perito, em outro ponto do laudo, assinala não haver, na gravação, evidências de edições.

Além de destacar a importância de uma perícia que esclarecesse as contradições do perito, Kfouri Neto justificou seu voto contrário à revisão das penas alegando que, ao condenar os réus, o júri levou em conta outras provas e informações além da fita e da confissão de culpa dos réus.

O voto de Kfouri Neto contra a revisão foi acompanhado pela desembargadora Lidia Maejima. Votaram a favor da absolvição os desembargadores Adalberto Jorge Xisto Pereira, Gamaliel Seme Scaff e Sergio Luiz Patitucci. Os três entenderam que os réus foram torturados e, portanto, suas confissões não têm valor legal.

“Os quatro acusados condenados, em nenhum momento, confessaram em juízo a prática do crime. Eles só confessaram na fase pré-processual; na fase do inquérito policial. E assim mesmo, na fase da tortura. Porque foram torturados. Não há dúvida”, sustentou o desembargador Adalberto Jorge Xisto Pereira em seu voto.

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