Hierarquia e estereótipos: Conselho Nacional de Justiça impõe restrições à constelação familiar no Poder Judiciário

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está analisando a utilização de técnicas terapêuticas alternativas no âmbito do Poder Judiciário. Um dos métodos em questão é a chamada constelação familiar, que tem sido utilizada como método de conciliação em Varas de Família, mas levanta preocupações sobre sua validade científica e possíveis impactos negativos, especialmente em casos de violência doméstica.

O relator do tema, conselheiro Marcio Luiz Coelho de Freitas, apresentou seu voto na sessão de hoje (17) e propôs restrições à utilização da constelação familiar. Ele afirmou que nenhum magistrado poderá obrigar vítimas de violência doméstica a se submeterem a esse procedimento. A discussão, no entanto, foi suspensa por um pedido de vista da conselheira Salise Sanchotene, sem prazo definido para retorno à pauta do CNJ.

O tema foi levado ao CNJ por um pedido de providências da Associação Brasileira de Constelações Sistêmicas (Abcsistemas), que busca regulamentar a aplicação da constelação familiar no Judiciário, estabelecendo um conteúdo mínimo para garantir segurança jurídica. No entanto, o CNJ tem recebido cada vez mais casos em que a constelação familiar é utilizada como fundamento para decisões judiciais, o que motivou a análise do assunto.

Para o relator, a constelação familiar é uma terapia alternativa baseada em dogmas e estereótipos dos papéis familiares, sem respaldo científico. Ele citou trechos retirados da página oficial de Bert Hellinger, fundador da teoria da constelação familiar, destacando que essa abordagem enxerga os conflitos familiares como resultado de disfunções no desempenho dos papéis de membros da família, reforçando estereótipos e hierarquias fixas. Essa teoria, segundo Freitas, é fundamentada em dogmas que não podem ser submetidos ao método científico.

O relator argumentou que a constelação familiar adota uma concepção misógina e preconceituosa, entrando em conflito com a concepção atual de família consagrada na Constituição. Além disso, ele trouxe o parecer do Conselho Federal de Psicologia, que indica que a adoção desse método no Judiciário pode desencadear ou agravar estados de dor, sofrimento e desorganização psíquica nas vítimas.

Apesar de não propor a proibição dos métodos alternativos de resolução de conflitos, como a constelação familiar, o relator defendeu restrições e maior rigor na aplicação desses procedimentos pelo Judiciário. Ele sugeriu que vítimas de violência passem por uma avaliação por equipe especializada antes de serem encaminhadas para qualquer tipo de procedimento alternativo. Além disso, destacou a importância de os profissionais que aplicam a técnica estarem capacitados para compreender e intervir de forma adequada nos casos de violência contra as mulheres.

Essas restrições têm como objetivo evitar que as pessoas sejam revitimizadas e lesionadas pelo próprio aparato estatal, afirmou Freitas. O assunto será decidido após o retorno da análise do tema pelo CNJ.

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