Uma das principais responsáveis pela catalogação dos mapas históricos do Brasil foi Isa Adonias, uma mulher que, em 1960, concluiu a descrição e organização da coleção de mapas manuscritos coloniais do Brasil. A partir do trabalho de pesquisadores como John Brian Harley, o campo da história social da cartografia se expandiu nas últimas décadas, incluindo estudos realizados por mulheres historiadoras, que utilizam a cartobibliografia de Adonias.
Analisando os croquis e mapas do território brasileiro do século 18 sob uma perspectiva de gênero, é possível identificar a presença feminina, especialmente das mulheres indígenas. Muitas vezes, essas mulheres eram colocadas à frente de expedições como intérpretes, estabelecendo a comunicação entre os mapeadores e as populações nativas. Sua presença transmitia segurança e confiança em encontros diplomáticos, desempenhando um papel político de mediadoras e intérpretes.
No entanto, a história oficial muitas vezes negligenciou a contribuição dessas mulheres, como no caso de uma indígena mencionada em um ofício de 1769, que foi instruída a liderar uma expedição ao lado de um padre capelão. Embora seu papel tenha sido crucial para o sucesso das expedições de mapeamento, a narrativa masculina dos ofícios não a mencionou, destacando apenas o papel do padre e dos soldados.
A invisibilidade da mulher indígena na história da cartografia está diretamente ligada à violência e desigualdade de gênero impostas pela colonização. No entanto, seus saberes, usos e percursos no território são fundamentais para afirmar sua identidade e a da sua comunidade. Negligenciar a presença dessas mulheres nos mapas é negar seus direitos originais e violar a história e a cultura de povos inteiros.
Os mapas, que representam visualmente territórios e territorialidades, contêm narrativas importantes sobre a presença e a contribuição das mulheres indígenas, que desafiaram os padrões patriarcais e masculinos da ciência cartográfica. A história da cartografia, quando revisada sob a ótica feminina, revela um novo terreno de possibilidades e desconstrói a imagem tradicionalmente masculina desse campo de conhecimento.