Sou jornalista e quero compartilhar com vocês um pouco da minha história e da minha luta para aceitar e afirmar minha identidade não binária. Nasci em 2001, faço parte da conhecida geração Z e cresci no distrito de Pedreira, na zona sul de São Paulo. Desde pequeno, fui rotulado como “queer”, termo que abrange minorias sexuais e de gênero, ou seja, pessoas que não se encaixam nos padrões heterossexuais e cisgêneros.
Ao longo da minha infância, tive acesso a uma série de experiências que fizeram parte da construção da minha identidade. Desde personagens como a travesti Vera Verão, aos DVDs piratas da Banda Calypso, Rebelde no SBT, até os canais a cabo como Disney, MTV e Nickelodeon, que eu assistia por meio de ‘gato’. Além disso, os clipes das cantoras pop Beyoncé, Shakira, entre outras, que eu acompanhava pelo YouTube. Tudo isso fez parte do meu desenvolvimento e sei que também marcou a infância de muitas outras crianças queer na periferia.
No entanto, só me reconheci como pessoa não binária na década seguinte. E essa jornada não foi fácil. Ser bicha e queer na periferia sempre foi algo evidente em mim, algo que não poderia ser escondido, mesmo que tentasse. A luta contra as violências, que muitas vezes são veladas, de invalidação e até mesmo de exclusão, foi e continua sendo um desafio.
A identidade não binária é complexa e muitas vezes não compreendida. O termo “queer”, que teve sua origem na língua inglesa, foi apropriado nas questões de gênero e sexualidade também no Brasil. Se você nasceu no gênero masculino e foge do esperado socialmente nas manifestações de gênero e sexualidade, você é queer. No entanto, na periferia, ainda sou reconhecido principalmente como bicha e negro.
Além disso, a descoberta da identidade não binária também me levou a questionar como isso seria recebido pelos meus familiares. Enfrentar a incompreensão e a violência gerada por quem ainda vê minha identidade como uma piada é uma realidade constante.
A aceitação e reconhecimento da identidade não binária é um desafio diário. Muitas vezes me perguntei se estava sendo “não binário do jeito certo” e se precisava corresponder a padrões binários para ser compreendido. A pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (FMB/Unesp) de 2021 revelou que cerca de 3 milhões de brasileiros se identificam como transgênero ou não binários. No entanto, a luta por reconhecimento e visibilidade continua.
Ser não binário é mais do que apenas uma questão de gênero. É uma luta constante, é a busca por representatividade e aceitação, é a desconstrução de padrões e a quebra de expectativas. E é importante que essa luta seja reconhecida e apoiada por toda a sociedade.
Por toda a minha jornada, sou e continuarei sendo queer, não binário e bicha. E acredito que, quanto mais conhecimento temos sobre as possibilidades de identidade de gênero, melhor será a maneira de nos reconhecermos e definirmos. A luta pela aceitação e representatividade continua, mas estou aqui para afirmar a minha identidade e contribuir para que mais pessoas não binárias possam ter voz e visibilidade.