Redução dos índices criminais no Rio de Janeiro não reflete maior segurança, alertam especialistas

A crise na segurança pública no Rio de Janeiro tem sido um tema de grande preocupação tanto para o governo federal quanto para a população. No entanto, é importante ressaltar que os principais índices criminais do estado têm apresentado uma queda significativa, atingindo os patamares mais baixos da série histórica.

De acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP), a taxa de homicídios em 2022 foi de 17,4 vítimas por 100 mil habitantes, a menor desde 1991. Além disso, a taxa de letalidade violenta, que inclui as mortes provocadas por policiais, também registrou uma redução, alcançando o índice de 25,5.

Apesar dessa queda nos índices, a região da zona oeste da capital fluminense enfrentou um aumento de 9,3% no número de homicídios até setembro deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado. No entanto, se considerarmos a taxa anualizada a partir da média mensal, os patamares ainda são menores do que os apresentados até 2020.

O governo de Cláudio Castro, atual governador do estado, atribui a redução nas estatísticas aos investimentos realizados na segurança pública e ao trabalho integrado das polícias Civil e Militar. No entanto, especialistas acreditam que essa aparente contradição se deve à influência dos confrontos entre criminosos nos índices criminais, como os homicídios. Quando há fortalecimento de uma facção ou aliança entre elas, o número de vítimas tende a diminuir.

De acordo com o sociólogo Daniel Hirata, coordenador do Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos da UFF, esses homicídios não estão distribuídos de forma homogênea pela região metropolitana do Rio de Janeiro. Eles estão concentrados na zona oeste e em alguns municípios da Baixada Fluminense, o que indica uma relação entre esses crimes e os confrontos de disputa territorial entre as facções criminosas.

Na zona oeste, onde esses grupos criminosos se confrontam, houve um aumento de 51% no número de vítimas de homicídios nos primeiros nove meses deste ano. Essa região é a principal responsável pelo crescimento desse crime no estado.

Para muitos especialistas, a redução nos índices criminais não significa necessariamente uma maior segurança para a população. A diminuição das taxas de morte está relacionada aos confrontos entre as facções criminosas e à reconfiguração das atividades criminosas, e não necessariamente às ações de segurança pública adotadas pelo governo.

Um exemplo disso é o número de fuzis apreendidos pela polícia. Neste ano, até setembro, foram apreendidos 487 fuzis, o que indica uma estimativa de mais de 680 armas desse tipo retiradas de circulação em 2023, superando o recorde de 550 apreensões registrado em 2019. A apreensão de fuzis é usada como métrica para estimar a quantidade de armamento em circulação.

Além disso, os especialistas apontam fragilidades nos dados divulgados pelo ISP. Há a hipótese de que casos de desaparecimentos possam ocultar homicídios, principalmente em áreas controladas por milícias. “Isso tem muita relação com o perfil dos milicianos que sabem como o estado funciona, como a investigação policial funciona e, portanto, sabem, inclusive, técnicas de desaparecimento altamente sofisticadas”, afirma Daniel Hirata.

A redução dos índices criminais também se estende aos crimes contra o patrimônio, como os roubos de rua, veículos e de carga. Esses crimes apresentam uma queda desde 2017, e os números deste ano estão menores, mesmo durante a pandemia, quando houve menor circulação de pessoas.

Uma possível explicação para essa diminuição nos crimes contra o patrimônio é a mudança na fonte de renda dos grupos criminosos. A expansão da cobrança de taxas por diferentes serviços em territórios cada vez maiores reduz a necessidade dessas organizações de obterem receitas por meio de crimes considerados mais arriscados.

Em nota, o Governo do Rio de Janeiro ressaltou que tem investido em efetivo, infraestrutura e tecnologia para as forças de segurança. Entre as ações realizadas estão a aquisição de câmeras operacionais portáteis, a construção do maior centro de treinamento de tropas convencionais e especiais do país e a inauguração da Agência Central de Inteligência da Polícia Civil.

No entanto, muitos especialistas não veem nas políticas de segurança adotadas no período uma explicação para a redução nos índices criminais. A diminuição de mortes violentas no estado segue um movimento registrado em todo o país, que está mais relacionado aos confrontos entre facções do que às ações de segurança pública.

Para Pablo Nunes, cientista político e coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), o aumento dos homicídios em 2017 está relacionado ao conflito entre o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), que ocorreu em diversos estados brasileiros. Quando esses confrontos são realocados em outros níveis, como o territorial, observa-se a redução dos homicídios ano a ano.

Em suma, a redução nos índices criminais no Rio de Janeiro não significa necessariamente uma maior segurança para a população. A queda está relacionada aos confrontos entre facções criminosas e à reconfiguração das atividades criminosas, e não às políticas de segurança adotadas pelo governo. Além disso, há fragilidades nos dados divulgados, como a possibilidade de casos de desaparecimentos ocultarem homicídios. A queda também se estende aos crimes contra o patrimônio, o que pode indicar uma mudança na fonte de renda dos grupos criminosos. O governo tem investido em segurança pública, mas muitos especialistas questionam a eficácia dessas ações.

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