No entanto, em todo o país, o quadro é oposto, com um aumento de 9,1% nos conflitos por terra. Foram registradas 791 ocorrências nos primeiros seis meses de 2023, em comparação com 725 no mesmo período do ano anterior. Vale ressaltar que esse é o segundo número mais alto da década, ficando atrás apenas de 2020, que teve 876 casos.
Os dados foram coletados pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc) e revelam que os povos indígenas foram os mais afetados pela violência no campo, representando 38,2% dos casos. Em seguida, estão os trabalhadores rurais sem terra (19,2%), posseiros (14,1%) e quilombolas (12,2%).
Além dos conflitos por terra, a CPT também documenta outras situações, como casos de trabalho escravo e conflitos relacionados à água. Ao todo, foram registrados 973 conflitos no campo durante o período, um aumento de 8,1% em relação a 2022, envolvendo cerca de 527 mil pessoas.
No que diz respeito ao trabalho escravo, houve um aumento tanto no número de registros (20%) quanto no número de pessoas resgatadas (43,9%). Foram resgatados um total de 1.408 trabalhadores, o maior número desde 2014. O agronegócio foi a atividade com o maior número de vítimas, com 532 socorridas no cultivo da cana-de-açúcar, 331 em lavouras permanentes e 46 na pecuária. Houve também resgates em atividades de mineração (104), desmatamento (63) e produção de carvão vegetal (51).
A redução dos conflitos na Amazônia Legal nos primeiros meses do governo do presidente Lula (PT) ocorre simultaneamente à queda no desmatamento e ao aumento das ações de fiscalização de crimes ambientais. Os alertas de desmate na Amazônia caíram 33,6% de janeiro a junho, atingindo a taxa mais baixa desde 2020.
No mesmo período, o Ibama aumentou em 166% as multas por crimes contra a flora em comparação com a média dos últimos quatro anos. Além disso, os embargos cresceram 111% e os termos de destruição de equipamentos usados em crimes ambientais aumentaram 260%. Esses dados foram divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática.
Apesar dessas melhorias, Ronilson Costa, um dos coordenadores nacionais da CPT, destaca que o número de conflitos na Amazônia ainda é alto. Ele ressalta que, embora o governo atual tenha começado a intensificar a fiscalização e a atenção para a região, muitas comunidades ribeirinhas e indígenas ainda sofrem pressão e violência.
Costa menciona os mundurukus, no Pará, como um exemplo de comunidade indígena que está enfrentando ameaças e violência, principalmente devido à presença de garimpeiros ilegais em suas terras. Além disso, ele menciona ações constantes contra ribeirinhos no Amazonas, com invasões por parte de empresas pesqueiras.
O coordenador da CPT ressalta que, apesar da queda nos conflitos na região amazônica, o número de pessoas afetadas aumentou, atingindo o maior índice dos últimos dez anos. Ele também destaca o aumento dos conflitos por terra em outras regiões do país, como Mato Grosso do Sul e Goiás, que apresentaram números significativamente mais altos do que antes.
De acordo com Costa, o aumento desses conflitos está relacionado ao crescimento da economia brasileira, que está se tornando cada vez mais voltada para a exploração minerária e a expansão do agronegócio. Essas atividades muitas vezes se expandem para territórios já ocupados, como áreas de agricultura familiar e terras indígenas e quilombolas.
Além disso, a lentidão nos processos judiciais que tratam de áreas em disputa também contribui para o agravamento dos conflitos. Famílias que aguardam há mais de 20 anos por uma solução se tornam cada vez mais vulneráveis, vivendo em situação de instabilidade e sujeitas a pressões por parte dos fazendeiros para abandonarem suas terras.
O coordenador da CPT também destaca o desmonte dos mecanismos de mediação de conflitos durante o governo anterior. Segundo ele, houve muitas invasões de terras indígenas e quilombolas por parte de fazendeiros e grileiros nesse período.
Outro relatório da CPT mostra um aumento de 29,8% nos confrontos por terra na Amazônia entre 2019 e 2022, em comparação com os quatro anos anteriores. Costa afirma que, apesar das expectativas iniciais de abertura de diálogo e mediação de conflitos no governo de Lula, há uma grande demanda por parte das comunidades. Ele destaca que o governo federal alega falta de recursos para implementar políticas relacionadas à questão.
No entanto, em agosto, Lula assinou decretos para retomar o Programa Nacional de Reforma Agrária, com medidas como assentamento de famílias, regularização de famílias assentadas e investimento em crédito para agricultores. Essas ações visam enfrentar os desafios enfrentados pelas comunidades do campo e promover a justiça agrária no país.