O xambá é uma expressão religiosa de matriz africana que compartilha características com outras nações do candomblé. Mas o reconhecimento como Patrimônio Vivo vai além de uma simples homenagem, sendo encarado como uma ferramenta na luta contra a intolerância e a violência direcionadas às religiões afrodescendentes.
Adeildo Paraíso da Silva, também conhecido como Pai Ivo de Xambá e líder do Portão do Gelo, explica que esses terreiros são considerados como “quilombos urbanos”, pois são locais onde as pessoas mantêm suas tradições culturais e religiosas. Com esse reconhecimento, o Estado passa a oferecer um olhar diferenciado para a preservação não apenas da religião, mas também da cultura.
A comunidade Xambá chegou à região no final dos anos 1920, trazida por Artur Rozendo Pereira, que fugia da repressão policial às religiões afrodescendentes. Maria das Dores da Silva, conhecida como Maria Oyá, fundou o Terreiro Santa Bárbara, que mais tarde se tornou a Casa Xambá do Portão do Gelo.
A palavra “xambá” remete à identidade étnico-religiosa praticada pelos adeptos desse culto em Pernambuco. Essa expressão religiosa possui elementos encontrados em rituais de povos da Nigéria, Camarões e Togo. Pai Ivo ressalta que essa espiritualidade faz parte da cultura sociocultural dos negros, expressando-se em terreiros de candomblé, samba, capoeira e maculelê.
O reconhecimento como Patrimônio Vivo de Pernambuco proporcionou à comunidade do Portão do Gelo um auxílio financeiro mensal para ações de preservação e transmissão das práticas religiosas. Além disso, em 2006, a comunidade também foi reconhecida como quilombo urbano pela Fundação Cultural Palmares.
Maria Emília Vasconcelos, professora de história da Universidade Federal Rural de Pernambuco, destaca que esse reconhecimento contribui para o combate ao racismo religioso, uma vez que as religiões de matriz africana e seus territórios sagrados são frequentemente alvo de preconceito e violência. Ela enfatiza a importância de ações educativas e de valorização das práticas culturais e religiosas afrodescendentes no espaço público.
O xambá se diferencia das outras nações do candomblé em sua estrutura religiosa, nos orixás cultuados e na forma de tocar os atabaques. Alexandre do Paraíso Nascimento, frequentador do terreiro, destaca que a manutenção da tradicionalidade é uma das características marcantes dessa vertente religiosa.
Para os praticantes do xambá, a religião não se resume apenas ao templo. O sagrado habita em cada um deles 24 horas por dia, e o templo é apenas um local onde são guardados os objetos sagrados e onde ocorrem os rituais. Essa espiritualidade acompanha os praticantes em todos os momentos de suas vidas.
O reconhecimento do Portão do Gelo como Patrimônio Vivo de Pernambuco e quilombo urbano é um marco importante na valorização e preservação das tradições religiosas e culturais afrodescendentes. Além de mostrar a importância dessas práticas, contribui para a luta contra a intolerância e a violência religiosa, promovendo o respeito e a valorização das religiões de matriz africana.