Massacre de Haximu marca três décadas e reacende discussão sobre proteção dos povos indígenas. Polêmica persiste.

Em 18 de agosto de 1993, rádios no Amazonas e em Roraima noticiaram o terrível assassinato de um grupo de yanomamis, composto por mulheres e crianças. Esse evento trágico marcou o primeiro e único caso de genocídio reconhecido pela Justiça brasileira até hoje, ficando conhecido como o massacre de Haximu. Os garimpeiros, liderados por Pedro Garcia, conhecido como Prancheta, fugiram para Boa Vista após o ataque, evitando a prisão.

O massacre ocorreu na aldeia de Haximu, localizada na fronteira entre o Brasil e a Venezuela, um ano depois da demarcação da Terra Indígena Yanomami. Segundo relatos da época, o episódio foi brutal, com a maioria das vítimas sendo mulheres, crianças e idosos. Homens que estavam em uma festa em outra comunidade escaparam da violência. Os sobreviventes conseguiram chegar a uma maloca na região do Toototobi, no Amazonas, em 24 de agosto.

Na época, o antropólogo francês Bruce Albert estava na região, auxiliando nas investigações e servindo como tradutor da língua yanomami. Para ele, o massacre era uma tragédia anunciada, resultado da segunda onda de invasão de garimpeiros na região. Ele ressaltou que a primeira onda ocorreu nas décadas de 1970 e 1980, impulsionada pela mineração de cassiterita.

As investigações do caso foram conduzidas pelo delegado da Polícia Federal, Raimundo Cotrim, que montou uma delegacia temporária na missão Toototobi para tomar os depoimentos das testemunhas e vítimas. O trabalho minucioso possibilitou a construção de um sólido documento jurídico.

Trinta anos após o massacre, a Terra Indígena Yanomami é a mais populosa do país, segundo o Censo de 2022, com 27.152 habitantes. No entanto, os problemas enfrentados pela comunidade yanomami se tornaram ainda mais complexos, como a expansão do garimpo e as atividades ilegais associadas ao crime organizado.

Missionário Carlo Zacquini, que testemunhou os horrores do massacre, relembra que muitos anos se passaram, mas os pesadelos persistiram. Durante sua estadia na região, ele testemunhou algumas das crises que atingiram os yanomamis ao longo dos anos. Muitos sobreviventes do massacre tinham chumbo em seus corpos, fruto dos disparos sofridos.

O massacre de Haximu despertou debates políticos e controversos. A Venezuela também foi condenada pelo caso, e houve reconhecimento tanto da Justiça brasileira quanto do governo venezuelano. No entanto, durante as investigações da CPI das ONGs, o senador Hiran Gonçalves contestou a ocorrência do massacre, levantando dúvidas sobre a existência da aldeia Haximu.

O caso ganhou notoriedade também porque o STJ reiterou o entendimento de que se tratava de um genocídio, destinando o julgamento a um juiz singular, e não a um júri popular. Segundo Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça e procurador da República na época da demarcação da Terra Indígena Yanomami, a publicidade do caso foi fundamental para sua finalização. Em 2011, as penas dos condenados foram consideradas extintas, e eles foram soltos. Somente em 2018, Pedro Prancheta foi preso em uma operação contra a mineração ilegal na TI Yanomami.

O massacre de Haximu foi um evento marcante na história do país, evidenciando a violência e as injustiças enfrentadas pelas comunidades indígenas. É crucial que esses casos sejam lembrados e que a luta pela demarcação e proteção das terras indígenas continue a ser um tema central na agenda política brasileira.

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