O estudo foi conduzido pela Associação Estadual de Defesa Ambiental (Aedas), entidade escolhida pelos próprios afetados das 15 cidades para fornecer assessoria técnica. Foram entrevistadas 1.873 pessoas, pertencentes a cerca de 600 famílias. Os resultados preliminares foram obtidos pela Agência Brasil.
Em 5 de novembro de 2015, a barragem da Samarco em Mariana se rompeu e liberou uma avalanche de rejeitos na Bacia do Rio Doce, resultando na morte de 19 pessoas e impactando populações de dezenas de municípios em Minas Gerais e Espírito Santo. Apesar disso, nenhuma pessoa foi presa.
Um acordo foi assinado em 2016 entre o governo federal, os governos de Minas Gerais e Espírito Santo, a Samarco e suas acionistas Vale e BHP Billiton para reparar os danos causados pela tragédia. A Fundação Renova foi criada para gerir mais de 40 programas de reparação, cujos custos são financiados pelas três mineradoras. No entanto, após oito anos, o processo reparatório tem sido marcado pela insatisfação e uma quantidade crescente de ações judiciais.
O estudo conduzido pela Aedas, chamado Registro Familiar, teve como objetivo investigar os efeitos e percepções dos afetados oito anos após o rompimento da barragem. Os dados foram coletados entre junho e setembro de moradores de 15 cidades, incluindo Belo Oriente, Naque, Ipaba, Ipatinga, Periquito, Bugre, Iapu, Santana do Paraíso, Fernandes Tourinho, Sobrália, Caratinga, Conselheiro Pena, Resplendor, Itueta e Aimorés.
De acordo com o levantamento, a má qualidade da água do Rio Doce está diretamente relacionada aos danos citados pelos afetados. Aqueles que dependiam da pesca como fonte de renda e alimento afirmam que não conseguem mais pescar como antes do rompimento da barragem. Além disso, agricultores que dependem do rio para irrigação lamentam que as plantações agora são menos resistentes e produtivas.
O estudo também analisou os danos sob uma perspectiva de gênero. Para 75,11% dos entrevistados, as atividades e tarefas realizadas pelas mulheres aumentaram. Segundo a coordenadora institucional da Aedas, Franciele Vasconcelos, as mulheres não têm sido consideradas sujeitos autônomos nas políticas de reparação. Ela ressalta que muitas mulheres eram pescadoras e agricultoras, mas são tratadas como dependentes, o que as coloca em desvantagem nas ações de reparação.
O estudo também buscou avaliar o alcance das medidas de reparação e o envolvimento dos afetados na elaboração dessas medidas. Segundo a pesquisa, 75% dos entrevistados afirmam não ter recebido auxílio financeiro emergencial e 97,65% não foram consultados previamente sobre medidas de reparação relacionadas ao emprego e à renda.
A Fundação Renova afirma, em nota, que até agosto de 2023 foram destinados R$ 32,66 bilhões para ações de reparação e compensação, incluindo pagamentos de indenizações e auxílios financeiros emergenciais. A entidade também menciona projetos sociais, como o Edital Doce e o Fortalecimento de Organizações Locais, que visam ao desenvolvimento comunitário na região.
Para marcar os oito anos da tragédia, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) lançou a campanha Revida Mariana, divulgando histórias pessoais relacionadas à tragédia. Os relatos divulgados corroboram os dados apresentados pela Aedas e destacam os impactos nas atividades econômicas e na identidade das comunidades atingidas.
O MAB também destaca o 4º Relatório Anual do Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática, publicado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) em agosto. O relatório destaca 295 impactos relacionados direta ou indiretamente ao rompimento da barragem no rio Doce, na parte capixaba. O monitoramento foi financiado pela Fundação Renova, mas a entidade ressalta que os resultados devem ser interpretados com cautela e complementados por outros estudos.
Oito anos após o rompimento da barragem, os atingidos continuam lutando por justiça e reparação dos danos causados. Milhares de pessoas ainda são afetadas pelos impactos ambientais e econômicos da tragédia, enquanto as ações legais se acumulam. A busca por um novo acordo para resolver o passivo judicial ainda está em curso, mas até o momento não houve consenso entre as partes envolvidas.