A ascensão do bolsonarismo elevou ao debate público uma doutrina baseada em tendências autoritárias, que rejeitava controles institucionais, admitia o atropelo das regras do jogo e considerava o uso da força para fazer valer suas vontades políticas. Essa linha de pensamento atraiu um largo contingente de eleitores e se incorporou ao ideário de agentes políticos.
A normalização ao longo de quatro anos dessas disposições autoritárias facilitou a disseminação da ideia de que aquele era um caminho legítimo ou uma transgressão aceitável quando usada a favor de um propósito político. Essa distorção foi anabolizada por informações falsas e absorvida por uma fatia ampla do eleitorado.
Esse é o efeito de um certo tipo de populismo, que também pode ser observado nos EUA. Uma pesquisa do Democracy Fund mostrou que 58% dos eleitores republicanos concordavam, em 2019, que Donald Trump poderia agir fora da Constituição se soubesse que era “a coisa certa”. No Brasil, a desconfiança artificial sobre o processo democrático e o antagonismo fabricado em relação às instituições estão sedimentados entre os bolsonaristas mais fiéis.
A dependência da força política de Jair Bolsonaro e a ausência de um polo alternativo nesse campo une extremistas convictos, beneficiários políticos do radicalismo e aqueles que temem desafiar o ex-presidente. A exclusão do ex-presidente do jogo eleitoral e a condenação de golpistas dificilmente mudará esse quadro de um ano para outro.
Portanto, a tentativa de golpe, a punição aos invasores e a relativa tranquilidade desde 8 de janeiro de 2023 não foram capazes de eliminar a tolerância com princípios antidemocráticos que se incorporou ao ideário de agentes políticos e de um largo contingente de eleitores. A doutrina baseada em tendências autoritárias continua sendo um fator determinante no debate público brasileiro, e ainda representa um desafio significativo para a estabilidade democrática do país.