A essência do Brasil se encontra na diversidade que nos une.

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O Brasil é um país formado por um campo de tensões, composto pelos povos originários, que já habitavam o território antes mesmo da existência do país, pelos europeus que chegaram para dominar a terra, pelos africanos trazidos à força e pelos imigrantes europeus, árabes e asiáticos que ao longo do tempo chegaram em ondas migratórias.

Dentro desse campo de tensões, é importante destacar a violência que ocorre entre os diferentes corpos, como apontado pela antropóloga e psicanalista Lélia Gonzalez.

Ser brasileiro significa fazer parte de um sistema aberto de relações étnico-raciais. Alguns indivíduos ouvem a pergunta: “Você é brasileiro? Não parece?!”. Mas afinal, como seria “parecer” brasileiro?

O negro, considerado o símbolo da mestiçagem, é muitas vezes tratado como cidadão de segunda classe. Já o indígena é visto como algo exótico, a menos que esteja com penas, e o branco, responsável por controlar as narrativas sobre a formação do Brasil, sonha em ser qualquer coisa, exceto brasileiro. A ascendência asiática e árabe, por sua vez, é usada para desqualificar a brasilidade.

Um exemplo disso é o grande número de descendentes de japoneses no Brasil, o maior número fora do Japão. São jovens que não falam japonês, que dificilmente visitaram o país de seus antepassados, mas que se identificam com a cultura brasileira há mais de um século. No entanto, eles continuam sendo chamados de “japas” com base em sua aparência, independentemente de serem netos de coreanos, chineses, entre outros.

Ser brasileiro é ser negro, é ser índio, é ser amarelo, é ser branco?

Até o presente momento, somos o resultado das relações entre todos esses grupos e também o resultado da negação da história e cultura dos primeiros habitantes. Para os negros e indígenas, é necessário resgatar suas ancestralidades em cada detalhe. Já para os brancos, cabe reconhecer uma história comum que muitas vezes descaracteriza sua própria ancestralidade.

Quando estou na Itália, terra dos meus avós, ouço os ecos da história de minha família, mas não me sinto italiana. Minha filha foi batizada em um terreiro de umbanda, minha música preferida é MPB e não acredito que a massa seja a base da culinária. Tive o privilégio de conhecer as pegadas daqueles que vieram antes de mim, mas isso não significa que me identifique com eles.

Não acontece o mesmo com negros e indígenas. Atualmente, está em cartaz no Sesc Belenzinho a exposição “Dos Brasis”, com curadoria de Igor Simões, Lorraine Mendes e Marcelo Campos. A exposição recupera uma parte da brasilidade negra que foi negligenciada durante décadas de ensino escolar baseado em versões históricas distorcidas. A exposição mostra como as relações étnico-raciais têm sido reduzidas por uma narrativa pálida e falsa.

Saímos da exposição impactados pela violência e pela grandeza. A exposição foi montada de maneira que as crianças possam circular livremente pelo local sem perceber tudo o que está em jogo. Ali, recuperamos traços de uma nacionalidade em comum.

Não podemos ser brasileiros sem ter sido influenciados pela exuberância natural dessa terra, que foi invadida para fins extrativistas e que se tornou um país por acidente. Se tivéssemos a capacidade de preservá-la, seríamos verdadeiramente o país do futuro, pois não há nada que o mundo necessite mais do que povos que reconheçam sua incompletude e se abram para a diversidade.

Texto traduzido e adaptado da fonte original

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