O Ministério Público Federal (MPF) deu um prazo de dez dias úteis para que a Prefeitura de São Paulo esclareça os motivos que levaram à suspensão da realização de procedimentos de aborto legal no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de capital paulista. A unidade era listada como uma das poucas instituições de referência para esse tipo de atendimento na capital paulista, porém, como revelado pela coluna, o serviço foi descontinuado há cerca de três semanas.
Segundo a gestão de Ricardo Nunes (MDB), a paralisação é temporária e serve para dar lugar a “cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher”. A prefeitura não informa quando os procedimentos serão retomados no local.
O Ministério Público Federal considera que a suspensão tem causado transtornos a mulheres e quer saber se as outras quatro unidades de saúde referenciadas para os casos de aborto legal têm efetuado o serviço, independentemente da idade gestacional. Além disso, o MPF também questionou o Ministério da Saúde sobre eventuais medidas que a pasta adotou diante da interrupção do serviço no Hospital Municipal Vila Nova Cachoeirinha.
As consequências da suspensão têm afetado diretamente as mulheres que necessitam do procedimento, levando a ONG Projeto Vivas a levar duas meninas a outros estados para que pudessem ter acesso ao aborto legal, uma delas, de 12 anos de idade, foi para Uberlândia (MG) e a outra, de 15 anos, viajou a Salvador. Ambas foram vítimas de estupro.
Embora a legislação brasileira não estabeleça um limite temporal para a realização da interrupção da gestação nos casos previstos em lei, é comum que serviços públicos de saúde criem seus próprios limites, baseando-se ou não em notas técnicas emitidas por órgãos oficiais. No Brasil, o aborto é previsto em lei quando há risco à vida materna, em casos de estupro e de gestação de feto anencéfalo.
O Ministério Público ressaltou que todas as demandas apresentadas integram um inquérito civil aberto desde 2016, em que a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, vinculada ao MPF em São Paulo, fiscaliza e garanta o cumprimento da Lei 12.845/2013. O texto assegura, entre outros direitos, o atendimento emergencial, integral e multidisciplinar a vítimas de violência sexual, o que inclui a realização do aborto legal.
No início desta semana, a coluna revelou o caso de uma mulher adulta, vítima de violência sexual, que enfrentou um périplo para conseguir realizar o procedimento em outro hospital depois de ter o seu agendamento no Cachoeirinha desmarcado, em razão da decisão da prefeitura. Ao menos outras 20 meninas e mulheres, segundo o Projeto Vivas, também procuraram a unidade, mas não foram atendidas, sendo em sua maioria vítimas de violência sexual.