Nota técnica assinada por entidades pede fim da política de privatização de presídios em meio a críticas de “mercado lucrativo”.

Um grupo de 86 entidades da sociedade civil e órgãos públicos divulgou uma nota técnica pedindo o fim da política do governo federal que oferece incentivos para a construção, reforma e privatização da gestão de presídios no Brasil através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O documento, assinado por entidades como o Núcleo Especializado de Situação Carcerária (Nesc) da Defensoria Pública de São Paulo, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) e a Associação Juízas e Juízes pela Democracia (AJD), argumenta que esses projetos acabam transformando o sistema prisional em um “mercado lucrativo”.

Segundo o texto da nota, os contratos firmados com a iniciativa privada podem favorecer o encarceramento em massa, com cláusulas contratuais que exigem taxas mínimas de lotação das unidades prisionais e com a remuneração da empresa por cada pessoa encarcerada. Isso pode levar ao aumento da precarização do sistema prisional e até mesmo à submissão de corpos negros a trabalhos forçados.

Além disso, as entidades destacam que o Brasil possui atualmente a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China. A população carcerária brasileira é composta por 46,4% de pessoas entre 18 e 29 anos e 67,5% de pessoas negras, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021. Isso significa que há uma sobrerrepresentação de pessoas negras em relação à população total do país, que é composta por 56% de pessoas negras.

Diante desse cenário, as entidades consideram inadmissível que as violações de direitos humanos se agravem sob o discurso de ressocialização, que conta com incentivos fiscais e investimentos milionários do governo federal. A nota técnica também chama a atenção para dois projetos em andamento do BNDES, um de privatização do presídio de Erechim, no Rio Grande do Sul, e outro de construção de um complexo prisional em Blumenau, em Santa Catarina.

O BNDES, em resposta, afirmou que os dois contratos de estruturação de projetos de parcerias público-privadas (PPPs) no setor prisional foram iniciados na gestão anterior e mantidos pelos atuais governadores estaduais. O banco também explicou que as PPPs do setor prisional têm como modelo a concessão administrativa, em que o poder de polícia e a gestão permanecem sob a responsabilidade exclusiva do poder público. O parceiro privado é responsável apenas pelas atividades de construção e manutenção de infraestruturas e serviços não finalísticos.

Ainda de acordo com o BNDES, a remuneração do parceiro privado é baseada na disponibilidade dos serviços, não havendo nenhum incentivo para aumentar a ocupação das vagas. Portanto, o banco reforçou que não se trata de privatizar o sistema prisional, mas sim de contar com a participação privada na construção da infraestrutura e na prestação de serviços gerais, como limpeza, alimentação, lavanderia, educação profissionalizante e suporte social.

A nota técnica reforça a necessidade de uma reflexão profunda sobre a política de privatização da gestão prisional no Brasil, levando em consideração as questões de direitos humanos e a situação da população carcerária.

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