Relatório adverte para risco ‘sem precedentes’ de catástrofes planetárias irreversíveis

A humanidade enfrenta um risco “sem precedentes” de atingir pontos de inflexão que podem desencadear um efeito dominó de catástrofes planetárias irreversíveis, adverte um relatório científico divulgado nesta terça-feira (5). A divulgação ocorre durante a COP28, a cúpula da ONU para mudança do clima, em Dubai, em um ano que está quebrando recordes de temperatura mensalmente e segue para ser o ano mais quente da história.

O relatório aponta 26 pontos de não retorno identificados a partir de evidência de mudanças, registros observacionais e modelos computacionais. Há diversos elementos que impactam e desestabilizam os sistemas em risco, como o desmatamento; mas, para a maioria, a crise climática é um deles.

De acordo com o documento, mesmo que a temperatura global parasse de subir agora —o planeta está 1,2°C mais quente em relação ao período pré-industrial— o colapso de alguns sistema pode já estar contratado. É o caso provável dos recifes de coral de águas quentes. Também não se pode descartar o colapso de outros quatro sistemas: as calotas de gelo da Groenlândia e da Antártida Ocidental, a corrente do Giro do Atlântico Norte, e partes do permafrost —em linhas gerais, camadas de terra congeladas.

Atingir pontos de não retorno pode resultar em impactos catastróficos na humanidade, diz o relatório. “A escalada da desestabilização do sistema terrestre ameaça perturbar a coesão social, aumentar os distúrbios mentais e amplificar a radicalização e a polarização. Isso tem o potencial de intensificar conflitos violentos, deslocamentos em massa e instabilidade financeira”, aponta o documento.

Tim Lenton, um especialista em sistemas terrestres da Universidade de Exeter, que liderou o relatório, disse que esses pontos de inflexão representam uma “ameaça para a humanidade de uma magnitude sem precedentes”.

O estudo também detalha uma série de pontos que poderiam inclinar a balança para um outro lado, como o desenvolvimento de veículos elétricos, energias renováveis e a adoção de dietas vegetarianas. “Imagine-se deitado em uma cadeira inclinada para trás, naquele ponto de equilíbrio em que um leve empurrão pode fazer uma grande diferença”, disse Lenton. “Você pode acabar caído de costas no chão ou, se tiver sorte, em pé novamente.”

Uma das principais preocupações é saber se as camadas de gelo da Antártida Ocidental e da Groenlândia irão derreter. Se isso acontecer, o nível do mar poderá subir dois metros até 2100, expondo cerca de 500 milhões de pessoas a um risco frequente de inundações costeiras. A camada de gelo da Groenlândia tem diminuído a um ritmo tão rápido que pode ser tarde demais para reverter o processo.

Os outros três pontos de inflexão mais preocupantes, devido ao seu potencial imediato, são a morte dos recifes de coral tropicais, o derretimento do permafrost e uma corrente oceânica chamada de Giro do Atlântico Norte. Outro ponto de inflexão oceânico é a Circulação Meridional de Revolvimento do Atlântico (AMOC), um amplo sistema que regula a transferência global de calor dos trópicos para o hemisfério norte.

De acordo com o relatório, seria verossímil —embora improvável— que a AMOC entrasse em colapso neste século. Essa mudança desestabilizadora poderia fazer com que extensas regiões recebessem muito menos chuva, o que potencialmente reduziria pela metade a área global onde trigo e milho são cultivados, indica o documento.

Os recentes incêndios florestais na Amazônia e nas florestas boreais do Canadá são um indicativo de que esses sistemas também estão em risco mais imediato do que se pensava. Lenton comparou o trabalho dos mais de 200 pesquisadores que elaboraram o relatório ao dos avaliadores de riscos que analisam um novo avião.

O colapso da AMOC seria como detectar algo que poderia fazer com que o avião “caísse do céu”, disse. Os autores pedem que os pontos de inflexão sejam incluídos no balanço global —chamado de Global Stocktake— discutido nas negociações da COP28 e nas metas nacionais de combate às mudanças climáticas. Sarah Das, uma cientista da Woods Hole Oceanographic Institution dos Estados Unidos, que não participou do relatório, afirmou que os dados estão agora “claros como a água”. “Os riscos de que a humanidade ultrapasse esses pontos de inflexão […] são terríveis, e o impacto nas vidas humanas, potencialmente assustador”, afirmou.

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