Mulher supera violência doméstica e juízo da comunidade católica para finalmente se divorciar após 15 anos de abusos físicos e psicológicos.

Medos superados e o início de um grande alívio marcam a história de Maria, que teve coragem de pôr um ponto final em um casamento marcado por abusos físicos e psicológicos. Aos 46 anos, ela lembra-se dos 15 anos de relacionamento que, segundo ela, a faziam sentir-se prisioneira. Um dos episódios mais traumáticos, que envolveu os filhos, foi quando seu então marido a fez comer dinheiro enquanto ela, atônita, observava seus dois filhos presenciando a cena.

“Não era uma vida, era uma prisão sem grades” disse Maria, que optou por um nome fictício para proteger seus filhos. De acordo com relatos, ela tinha perdido a esperança de seguir com o casamento e criou forças para colocar um fim nesse ciclo de abusos. No entanto, Maria também enfrentou forte oposição de familiares, com destaque para a mãe, e até de membros da comunidade religiosa a que pertencia. A resistência da família em aceitar o divórcio de Maria foi surpreendente e remonta a sua infância, quando foi informada de que passaria fome e não teria para onde ir. “Eu não tinha apoio dentro da própria casa” lembrou a advogada.

Outro fator que contribuiu para impedir Maria de tomar uma atitude contra os abusos foi a forte influência de seus companheiros religiosos, que também desencorajaram qualquer tentativa de separação. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi procurada para comentar sobre essa situação, mas não se pronunciou. A pressão exercida pela igreja a que fazia parte, bem como seus familiares, contribuiu para que Maria se sentisse aprisionada pelo marido.

A igreja católica sempre teve um papel de destaque na sociedade brasileira, e a dissolução do casamento tornou-se um verdadeiro tabu. A forte influência da igreja, que considera o matrimônio sacramental e a representação da presença de Deus na vida do casal, foi outro ponto que impediu Maria de buscar o divórcio com mais rapidez. No entanto, pesquisadores e teólogos afirmam que a igreja católica, ao longo do tempo, têm buscado desconstruir essa visão ultrapassada e reconhecer a importância da igualdade na relação.

O caso vivido por Maria não é único, e um grande número de mulheres enfrenta o mesmo tipo de abuso diariamente. A fundadora da ONG Fala Mulher, Suzanne Marie Mailloux, relatou que muitas mulheres se acostumam com a violência do cotidiano simplesmente por não terem alternativas. Segundo ela, a pressão social contribui para que a mulher se sinta cada vez mais aprisionada em um ciclo de abusos.

No caso de Maria, o abuso começou aos poucos e envolveu o controle sobre a vida e as ações dela. Antes, Maria era ativa e extrovertida, mas perdeu sua independência pouco a pouco. O marido passou a controlar até mesmo suas roupas, assegurando-lhe que ela não poderia usar roupas que não fossem largas e formais. Dessa forma, ficou evidente que o problema era o crescimento dela, e isso incomodou o marido. Ela lembra que enfrentou dificuldades até mesmo para fazer aulas de direção e ingressar em uma faculdade, mas resistiu e, hoje, já atingiu seus objetivos.

O ex-marido de Maria também tinha um comportamento machista e chegou a praticar traições que lhe causaram grande sofrimento. Uma atitude dele, bastante marcante, foi quando ele a obrigou a engolir dinheiro na frente dos filhos. Este episódio contribuiu para que Maria buscasse, cada vez mais, a força e a coragem necessárias para superar essa situação.

O sentimento de medo e de prisão sem grades, que permeou por tanto tempo a vida de Maria, finalmente deu lugar a um sentimento de alívio e liberdade quando ela decidiu se separar e pôr um fim em uma relação marcada por abusos, ressaltando sua história de superação.

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