MPF investiga parceria suspeita de indígenas mundurukus com empresa acusada de irregularidades em projeto de crédito de carbono na Amazônia.

Indígenas da etnia Munduruku, suspeitos de estarem envolvidos em garimpo ilegal em seu próprio território, estão desenvolvendo um projeto de crédito de carbono em parceria com uma empresa acusada de irregularidades em outras iniciativas de geração desses créditos na Amazônia. O projeto foi implementado sem consulta às diversas aldeias da Terra Indígena Mundurucu, no Pará, especialmente aquelas que se opõem ao garimpo de ouro no território tradicional – a grande maioria das comunidades é contrária à mineração ilegal.

O caso está sendo investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) no Pará, que está apurando um possível desrespeito ao procedimento de consulta prévia, livre e informada aos mundurukus. O MPF também está cobrando explicações da Associação Indígena Pusuru, que abriga os indígenas denunciados pelo MPF por associação criminosa e garimpo ilegal, e da AGFOR Empreendimentos, a empresa parceira dos indígenas no projeto de crédito de carbono.

A AGFOR Empreendimentos, que pertence ao norte-americano Michael Greene, está sediada em Guarulhos (SP) e está ligada a outros empreendimentos com o nome AGFOR, como a Brazil AGFOR. A reportagem constatou que o endereço informado por uma das empresas em um site da AGFOR, em Manaus, na verdade é o de um açougue que não conhece o empreendimento.

O projeto de crédito de carbono envolve a geração de créditos a partir de atividades que evitam o desmatamento e a degradação da floresta. Empresas no mercado voluntário compram esses créditos para compensar suas próprias emissões de gases de efeito estufa. No entanto, a comercialização de créditos de carbono no mercado voluntário ainda precisa ser regulamentada, especialmente quando se trata de terras indígenas, de acordo com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Em julho, a Defensoria Pública do Pará ajuizou quatro ações civis públicas contestando projetos de crédito de carbono em assentamentos agroextrativistas em Portel (PA), no arquipélago do Marajó. Segundo a Defensoria, houve grilagem de terras públicas e uso de documentos inválidos de propriedade. A Brazil AGFOR é uma das empresas mencionadas nessas ações.

A Terra Indígena Mundurucu é uma das mais impactadas por garimpos ilegais no Brasil, em termos de área devastada. Garimpos ilegais continuam em atividade, destruindo as roças dos indígenas e causando problemas de saúde, como malária e diarreia. Crianças mundurukus têm sofrido com problemas de desenvolvimento relacionados à intoxicação por mercúrio proveniente dos garimpos.

Diante dessa situação, indígenas envolvidos em garimpo ilegal estão tentando implementar um projeto de crédito de carbono, sem consultar as aldeias que são contrárias ao garimpo. Um indígena da Associação Pusuru, que foi denunciado pelo MPF por integrar um grupo criminoso para a exploração ilegal de ouro, está liderando esse projeto. O advogado da associação afirmou que não houve interrogatórios nem detalhamento das acusações contra o indígena.

O projeto de crédito de carbono está sendo prestado pela AGFOR como uma consultoria, mas ainda não foram estabelecidos os valores de remuneração, devido às alegações de ilegalidade e falta de consulta. O dono da empresa afirmou que só desenvolveu projetos em Portel e que está sendo perseguido por tentar ajudar o povo indígena.

Enquanto isso, os garimpos ilegais continuam devastando a Terra Indígena Mundurucu, assim como a Terra Indígena Kayapó, onde também houve a promessa de recursos com a geração e venda de créditos de carbono, mas o projeto foi desistido. As aldeias kayapós também estão cercadas por crateras e tem sofrido com a presença de garimpeiros.

O caso dos indígenas mundurukus envolvidos em garimpo ilegal e no projeto de crédito de carbono em parceria com a AGFOR está sendo investigado pelo MPF, que está buscando esclarecimentos e avaliando o possível desrespeito ao procedimento de consulta prévia, livre e informada aos indígenas. A situação evidencia a necessidade de uma regulamentação clara e efetiva para a geração e venda de créditos de carbono em terras indígenas, a fim de evitar irregularidades e garantir a participação e o consentimento dos povos indígenas nessas iniciativas.

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