Execução pública em Cuiabá: quatro homens condenados à pena de morte e cabeças decapitadas enviadas aos locais dos crimes

No dia 24 de maio de 1800, na Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá, capitania de Mato Grosso, uma forca foi erguida para a execução de quatro homens condenados pela Justiça. Dois deles eram acusados de terem assassinado o cirurgião Francisco de Paula de Azevedo. Além do enforcamento, suas cabeças decapitadas seriam enviadas aos lugares onde cometeram os crimes. Essas punições faziam parte das Ordenações do Reino e tinham como objetivo instilar medo e servir como exemplo para os moradores que assistiam às execuções públicas.

Uma das acusadas foi Catharina Maria Fortes, cunhada da vítima e residente da vila. Ela foi presa para averiguação, julgada e condenada ao degredo para Benguela, local que atualmente pertence a Angola. Esse castigo consistia na expulsão do condenado de sua moradia para diferentes áreas do império português por vários anos ou até mesmo por toda a vida. Catharina foi transferida para a cadeia do castelo de São Jorge, em Lisboa, e tinha a intenção de cumprir sua pena após cruzar o Atlântico.

No entanto, Catharina não aceitou seu destino e, em 1803, enviou um requerimento ao príncipe regente dom João 6º, solicitando o perdão da pena de degredo para Benguela ou a comutação para Castro Marim, no Algarve, próximo à fronteira com a Espanha. O pedido de perdão ao rei era uma estratégia comum utilizado pelas condenadas, na esperança de livrar-se de suas culpas ou diminuir suas penas. Para os governantes, conceder o perdão poderia ser um ato misericordioso e uma forma de consolidar seu poder.

O representante de Catharina apresentou vários argumentos em seu requerimento, como o fato de o rei ter concedido muitos perdões na Sexta-Feira Santa, a existência de duas pessoas culpadas pelo crime, o status de “miserável donzela” da acusada (que era filha de uma figura importante na vila) e a preferência do rei em não enviar mulheres já desterradas para os degredos ultramarinos.

Testemunhas em Lisboa afirmaram que Catharina era uma pessoa de qualidade, respeitosa às leis divinas e tratada com nobreza pela lei. Uma das testemunhas declarou que ela havia sido presa e condenada com base em “indícios”, conforme mencionado em seu requerimento. Outra testemunha afirmou que ela tinha uma relação conturbada com a vítima. Já o cunhado de Catharina, descrito como uma pessoa de má conduta e propensa a cometer crimes, não participou da partilha dos bens da família, pois foi morto em 1799.

Não sabemos ao certo o que levou Catharina ao assassinato de seu cunhado, se ela teve participação no crime, se obteve o perdão solicitado ou a comutação da pena. No entanto, sabemos que ela fazia parte de uma das principais famílias da vila e que, mesmo em uma sociedade escravista e hierarquizada, ela e sua irmã recorreram à Justiça para buscar seus direitos através dos meios legais disponíveis.

O projeto “Mátria Brasil” visando retratar mulheres relevantes ao longo da história do país, desde a invasão portuguesa até os dias atuais. Os textos são escritos por historiadoras e historiadores de diferentes regiões do Brasil e são publicados semanalmente ao longo de seis meses. A iniciativa foi idealizada pela professora Patrícia Valim, do departamento de história da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que também é uma das coordenadoras do projeto.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo