Operações policiais causam fechamento de estabelecimentos comerciais em favelas do Rio de Janeiro, aponta relatório.

Mais da metade dos estabelecimentos comerciais nas favelas da Vila Cruzeiro, na Penha, e Mandela de Pedra, em Manguinhos, no Rio de Janeiro, tiveram que fechar as portas pelo menos um dia devido a operações policiais entre os anos de 2021 e 2022. Esses dados fazem parte de um relatório intitulado “Favelas na Mira do Tiro: Impactos da Guerra às Drogas na Economia dos Territórios”, elaborado pelo CESEC (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania).

De acordo com o relatório, 51,3% dos comerciantes afirmaram ter sido obrigados a fechar temporariamente suas lojas nos dias de ações policiais. Na Vila Cruzeiro, os estabelecimentos fecharam em média uma vez durante o ano, enquanto no Mandela de Pedra, a média foi de duas vezes. Procurada para comentar os dados, a Polícia Militar não respondeu.

A pesquisa foi realizada em duas favelas que registram o maior número de confrontos com a presença policial entre junho de 2021 e maio de 2022, segundo dados do Instituto Fogo Cruzado, responsável pelo mapeamento de tiroteios. Foram entrevistados donos de bares, lanchonetes, lojas de roupas, eletrônicos, oficinas e outros tipos de estabelecimentos, sejam eles formalizados ou não. Ao todo, foram consultados 77 comércios no Mandela de Pedra e 290 na Vila Cruzeiro.

Além do fechamento temporário das lojas, 74 estabelecimentos tiveram problemas para receber e enviar encomendas, 63 tiveram a interrupção de energia elétrica e 47 relataram interrupção no fornecimento de internet. Considerando os dias fechados por conta das operações e os danos causados durante os confrontos, o estudo estima que a perda de faturamento do comércio nas duas comunidades seja de R$ 2,5 milhões por ano.

Jane Nobre, esteticista que possui um espaço de bronzeamento na laje no complexo da Maré, também relatou os impactos das operações policiais em seu negócio. “Quando tem operação policial, não posso atender no meu espaço. A laje do prédio é uma das mais altas da região. O risco de uma bala perdida ou de ser coagida por policiais é grande. Tem época em que operação é três ou quatro vezes por semana. Isso interfere poderosamente no fechamento do caixa”, afirma Jane.

Além desses problemas, os tiroteios em operações também causaram prejuízos em equipamentos. Na Vila Cruzeiro, 18,7% dos comerciantes relataram ter sofrido com bens danificados ou destruídos, como geladeiras, refrigeradores e marcas de tiros nas paredes, janelas e caixas d’água. Carros usados para prestar serviço também foram danificados, segundo os comerciantes. No Mandela, 9% dos lojistas tiveram prejuízos semelhantes.

A socióloga Rachel Machado, coordenadora da pesquisa, destacou a importância desses comércios para a renda das famílias nas favelas. Segundo ela, esses estabelecimentos são fundamentais não apenas do ponto de vista econômico, mas também socialmente. Quando há uma operação policial que paralisa tudo e fecha tudo, os impactos vão além do prejuízo financeiro, impedindo as pessoas de circularem onde vivem.

Além dos prejuízos para os comerciantes, os moradores também são afetados pela violência armada. Segundo a pesquisa, 60,4% dos moradores dos complexos da Penha e de Manguinhos afirmaram terem sido impedidos de trabalhar devido aos tiroteios nos 12 meses anteriores ao estudo. Em média, eles perderam 7,5 dias de trabalho, o que resultou em uma perda anual estimada em R$ 9,4 milhões.

Rachel destaca que as consequências dessas operações policiais violentas são diversas e impactam diversas camadas da sociedade. Ela afirma que o estado prejudica a economia das favelas com essas ações, fazendo com que os moradores percam o trabalho e sejam impedidos de circular pela cidade.

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