Repórter São Paulo – SP – Brasil

Marco Temporal: a continuação da colonização e a ameaça aos direitos dos povos indígenas

Desde a chegada dos colonizadores ao Brasil, há mais de 500 anos, os povos indígenas vivem sob a imposição da cultura não indígena. Desde então, diversos aspectos de nossas vidas foram afetados: língua, cultura, filosofia, crenças, roupas e pensamentos europeizados foram impostos como os corretos e dignos de serem seguidos. No entanto, fica claro que esse processo colonizador não foi benéfico para todos os envolvidos.

É lamentável que nessa imposição forçada muitos povos indígenas tenham sido dizimados, expulsos, violados e submetidos a tentativas de apagamento cultural e intolerância em relação às suas crenças sagradas. Continuamos enfrentando problemas hoje em dia, sendo vistos como uma ameaça e um empecilho para o país, o mesmo país que não foi invadido por nós, mas sim, mantido por nós.

O atual debate em torno do marco temporal é mais um exemplo dessa realidade distorcida. Essa proposta busca marcar uma data para determinar quem é considerado originário ou não. Segundo essa tese jurídica, apenas os povos indígenas que ocupavam suas terras em 5 de outubro de 1988, data da publicação da Constituição Federal do Brasil, têm direito à demarcação de seus territórios tradicionais.

Essa tese coloca em risco as terras que estavam desocupadas ou ocupadas por outras pessoas nessa data, implicando que elas não podem ser demarcadas como terras indígenas. Esses territórios, portanto, podem ser considerados propriedade de particulares ou do Estado, em detrimento das comunidades indígenas que ali vivem há séculos.

Essa imposição de um marco temporal para os povos indígenas é uma continuação da colonização. Será que seria justo impor um marco temporal também para os não indígenas, negando-lhes os direitos sobre as terras que ocupam atualmente, até a data da invasão em 1500? Mas nós não somos assim, não buscamos desocupar terras de pequenos produtores que vivem daquilo que produzem. Nossa luta é apenas pela demarcação das terras indígenas que estão em processo de demarcação, as quais se tornam cada vez mais vulneráveis devido à instabilidade provocada por esses processos violentos maquinados pelo setor ruralista.

Vivemos em um cenário em que o marco temporal, mesmo claramente inconstitucional, abre espaço para a exploração predatória das terras indígenas, contrariando tratados internacionais de proteção dos povos indígenas. Projetos de lei como o PL2903, que tramita no Senado, ameaçam os direitos de gestão e usufruto dos povos indígenas, mesmo em territórios já demarcados.

No entanto, é importante ressaltar que espaços como este permitem que a voz dos povos indígenas seja amplificada. O futuro é indígena e ancestral, e a demarcação das terras indígenas é fundamental para enfrentarmos a crise climática. Por isso, estamos engajados nessa grande campanha coletiva contra o marco temporal.

***Este conteúdo é uma coluna de opinião que expressa as ideias do autor, não do veículo.

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