Livro de pesquisador da USP explora a relação entre fé evangélica, crime organizado e violência urbana no Brasil

Desde os últimos anos, a redução dos homicídios é um tema que desperta o interesse dos pesquisadores na área de segurança pública no Brasil. Entender os motivos por trás dessas variações é uma tarefa complexa, que envolve análise de dados estatísticos, gráficos e também histórias de vida. Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, se dedicou a investigar essa temática em seu novo livro intitulado “A Fé e o Fuzil: Crime e Religião no Brasil no Século 21”.

A obra, lançada recentemente, procura mapear o papel das igrejas evangélicas e do crime organizado no contexto da violência urbana brasileira. Paes Manso destaca a rapidez na transformação tanto da taxa de homicídios, que chegou a 98 mortes por 100 mil habitantes em São Paulo em 1999, como do crescimento da fé protestante, que passou de 4% da população nos anos 1960 para uma presença de mais de 178 mil templos hoje em dia.

O autor, que já havia publicado os livros “A Guerra” e “A República das Milícias”, retoma nessa obra aspectos dessas produções anteriores para explicar diferentes aspectos da violência no país. Ele destaca a criação de regras pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) como uma forma de combater abusos estatais e desordens nas ruas. Além disso, Paes Manso aborda a produção de ordem através da morte, realizada por grupos de extermínio direcionados às populações pobres das periferias das grandes cidades.

O livro também explora a relação entre a fé e a criminalidade, como ocorre no Complexo de Israel, no Rio de Janeiro, onde a venda de crack é proibida e os traficantes ostentam símbolos judaicos. Segundo o autor, as igrejas evangélicas oferecem um discurso de produção de sentido e ordem para os habitantes dessas áreas, além de proporcionar uma maior autoestima para aqueles que se sentem discriminados.

A obra também aborda as transformações socioeconômicas vividas pelas populações migrantes no Brasil ao longo do século 20. Paes Manso ressalta que a falta de empregos e o empobrecimento geraram um ceticismo em relação à capacidade do Estado garantir condições de vida dignas nas áreas mais pobres. Nesse contexto, as igrejas evangélicas passaram a oferecer uma perspectiva de prosperidade individual, incentivando as pessoas a empreenderem por conta própria.

O livro se baseia em entrevistas e depoimentos que dão voz e rosto aos personagens envolvidos na discussão sobre a violência e a religião. Por meio de casos como o de Marcelinho, um ex-criminoso que passou por um processo de conversão, o autor busca desmistificar preconceitos e estereótipos em relação à religião.

Para Paes Manso, a conjunção entre fé, crime e economia informal cria um cenário complexo, onde a busca por dinheiro e sobrevivência se tornam cada vez mais difíceis. Por fim, ele resgata a ideia de Ailton Krenak sobre a importância de adiar o fim do mundo, como uma forma de encarar o pessimismo presente no livro e buscar possíveis soluções para os desafios enfrentados pela sociedade atual.

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