Ser jovem livre em 2023 traz desafios massivos; é um verdadeiro inferno enfrentar as pressões e as expectativas impostas pela sociedade.

Sou da geração anterior e isso é algo que preciso dizer antes de começar este texto, mas infelizmente essa desculpa não cola. Então, vou tentar novamente. Quero iniciar este texto afirmando que sou uma mistura de coisas boas e não tão boas, assim como todo mundo. Porém, essa abordagem parece clichê, simplista e pouco profunda. Talvez seja melhor começar dizendo que não sou eu. Vocês se lembram da comunidade do Orkut chamada “Não fui eu, foi meu eu lírico”? Pois bem, eu vou criar a versão “Não fui eu, foi meu eu sexual”. Mesmo que isso pareça uma piada boba, minha intenção é parecer mais profunda.

Vamos tentar ter uma conversa um pouco mais terapêutica agora. Por vezes, algo dentro de mim deseja exatamente o oposto do que aprendi com autoras feministas famosas (e também influenciadoras feministas no Instagram que repetem frases já ditas por essas autoras). Acho que é isso.

Não podemos transar com homens casados que não estão em relacionamentos abertos porque vai contra a sororidade com a mulher casada com eles. Isso é correto, não podemos mesmo. Afinal, não conhecemos a esposa e o homem em questão é atraente, e de repente estamos passando por um grande período de abstinência. Mas mesmo assim, não podemos. Isso deve valer para 99 vezes, não é? Porém, sempre tem aquela vez que escapa, não é mesmo? E não é nos momentos de escapada que vivemos? Vamos vencer distraídos e gozar escapados. Somos capazes de controlar nossos desejos? O inciso 156.B não permite deslizes? É um verdadeiro inferno ser jovem e livre em 2023.

Também não podemos transar com chefes ou colegas de trabalho em posição hierárquica superior, nem aceitar jogos de poder que possam nos tornar submissos. Só de escrever essa frase já fico animada. Nem mesmo as 67 leituras feministas mais poderosas foram capazes de superar minha ferida narcísica, minha vontade de ter tido um pai intelectual e firme. Prometo que em outra vida serei melhor. Tive um caso com um chefe por sete anos simplesmente porque ele, quinze anos mais velho, disse um dia que meu trabalho estava péssimo. Como aquilo foi sexy. Sinto falta de Rita Lee cantando “Vestindo fantasias, tirando a roupa”.

Tenho conversado e convivido com muitas pessoas de vinte e trinta anos. Elas são adeptas de relacionamentos abertos e poliamor, e quanto mais as ouço, mais percebo como eu costumava transar de forma errada e insatisfatória quando tinha a idade delas. Sinto saudades de transar da forma errada.

Essas pessoas criam 35 regras para manter um relacionamento aberto. Que tipo de abertura é essa com tantas regras? Eu nunca fui infiel, mas isso não me impediu de cometer pequenas transgressões. Algumas coisinhas aqui e ali, raras, esporádicas, livres, maravilhosas, sempre acordadas e comunicadas de forma honesta, na atmosfera silenciosa do “eu sei que você sabe, eu também sei de você, afinal, estamos vivos, somos humanos, mas ainda existe amor aqui”. Estaria eu errada?

Provavelmente sim. Será que sou uma pessoa velha e má? Com certeza. Mas se a única opção é sufocar o desejo ou segui-lo através de 35 regras, não tenho ideia de como um desejo pode sobreviver.

Existem os “esquerdomachos”, por exemplo. Eles são detestáveis? Uma perda de tempo? Sem dúvida. No entanto, meu cérebro foi programado, por décadas, para gostar deles. Lembro de um deles que nunca, em hipótese alguma, perguntava sobre minha vida ou meu dia. Como nos ensinou Lacan, ele nem acreditava na existência da mulher. Mas frequentemente ele me mandava fotos de suas expedições, palestras e encontros, sempre exausto e suado em nome da causa. Tudo pela nossa salvação diária. Eu pensava “eca, sai daqui, seu nojento, vai fazer terapia, macho”? De jeito nenhum. Eu pedia mais fotos. De preferência sem roupa. Vai lá, gostoso, milita bastante. Me manda essa foto com a foice e o martelo, seu tesão. Exatamente, me despreza, me domina, seu gostoso com doutorados em filosofia e ciências sociais. Quem é o objeto aqui?

LINK PRESENTE: Se você gostou deste texto, como assinante você pode ter acesso a cinco links gratuitos por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo