De acordo com Silveira, que possui experiência de 40 anos trabalhando com dependentes químicos, a questão fundamental é a vulnerabilidade social, que se configura como um fator de risco para o abuso de drogas por pessoas em situação de rua. Ele destaca que a expressão “cracolândia” é inadequada, pois dá a entender que se trata de um local de diversão, quando, na verdade, é apenas uma forma de aliviar o sofrimento de pessoas que utilizam drogas como escape da miséria social. O médico defende as políticas de redução de danos como uma solução mais adequada para enfrentar o problema.
Quando questionado sobre a existência da cracolândia no centro de São Paulo e o que motiva essa situação ligada ao consumo de crack, Silveira responde que toda grande metrópole possui problemas similares devido à população desfavorecida que vivencia situações de rua e não consegue se encaixar nos padrões da sociedade. Ele critica a abordagem brasileira, afirmando que o país não sabe lidar adequadamente com aspectos negativos e sombrios. Em vez disso, o Estado culpa os indivíduos excluídos, usando as drogas como bode expiatório para justificar a sua exclusão social.
O psiquiatra destaca que a cracolândia não é composta apenas por usuários de drogas. Ele ressalta que a principal droga de abuso nessa região é o álcool e que a maioria dos usuários de droga, tanto lícitas como ilícitas, não se torna dependente. Silveira ressalta que a exclusão social é um fator de risco para o desenvolvimento da dependência. Portanto, é importante compreender que a droga é consequência dessa exclusão, não a causa.
Com relação à abordagem adotada pelas autoridades em relação à cracolândia, Silveira critica a truculência policial, alegando que a quantidade de drogas apreendidas é insignificante e que o foco deveria ser o combate ao tráfico por meio de serviços de inteligência. Ele afirma que a maioria das pessoas abordadas na cracolândia não é traficante, mas sim usuários ou intermediários dependentes. Silveira defende o monitoramento internacional para combater o tráfico e a melhoria da qualidade de vida da população excluída como medidas eficazes.
Em relação ao tráfico de drogas, Silveira destaca que é um problema mais abrangente e não se resume apenas à cracolândia. Ele enfatiza que pessoas de classe média e alta também fazem uso de drogas, mas de forma mais discreta, através do delivery. No entanto, a administração pública não age de forma truculenta com essas pessoas, pois elas não vivem em situação de miséria social. Ele critica a abordagem truculenta do Estado tanto policial quanto médica, através das internações involuntárias. Silveira ressalta que não há evidências científicas da eficácia desse tipo de intervenção.
Em relação ao tratamento do problema em outras partes do mundo, Silveira menciona o modelo bem-sucedido de Vancouver, no Canadá, que adotou a estratégia de redução de danos. Ele destaca a importância de oferecer suporte e assistência às pessoas em situação de exclusão social para promover uma melhoria na qualidade de vida. No entanto, é fundamental que essas políticas abordem a raiz do problema, que é a vulnerabilidade social, em vez de focar apenas na criminalização e repressão ao tráfico de drogas.