Embora os dados mostrem uma tendência de queda desde 2018, os números ainda estão em um patamar elevado. Somente no ano passado, o SUS desembolsou R$ 41 milhões para o atendimento hospitalar de 17,1 mil pessoas feridas por tiros, conforme informações do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do SUS. Essa quantia seria suficiente para cobrir quase 1 milhão de mamografias ou 10 milhões de exames de hemograma completos.
Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, destaca que o custo de cada internação por arma de fogo é 3,2 vezes maior do que o gasto federal com saúde per capita ao ano. Isso evidencia a complexidade desses casos e revela que, apesar da queda, o valor ainda é consideravelmente alto em relação ao investimento em saúde.
Em 2022, o valor médio das internações devido a agressões com armas de fogo foi de R$ 2.391, enquanto a despesa pública federal per capita foi de R$ 737,89. No entanto, esse valor não engloba todas as despesas públicas relacionadas ao atendimento dessas vítimas, uma vez que estados e municípios também têm gastos próprios com saúde.
A pesquisa aponta que a redução nos gastos com internações é resultado de vários fatores, como a diminuição dos crimes violentos, a defasagem dos preços de referência da tabela do SUS e a gravidade dos casos que necessitavam de atendimento médico. Ricardo ressalta que, ao analisar os casos mais graves, que são os mais caros para o sistema de saúde, também houve uma queda significativa nos últimos anos.
As internações mais complexas costumam demandar um tempo de hospitalização maior e frequentemente requerem a realização de mais procedimentos médicos. Esses são casos nos quais as vítimas sofreram traumas graves na região craniana, torácica ou em órgãos abdominais internos, lesões que muitas vezes levam à morte. Por outro lado, os casos de menor gravidade geralmente envolvem ferimentos em braços e pernas.
Os casos de alta letalidade deixaram de ser predominantes em 2015, enquanto as internações de pacientes menos graves tiveram um aumento nos últimos dois anos, após uma queda acentuada entre 2017 e 2020. No ano passado, os casos menos graves representaram 44% das internações, em comparação com 27% dos casos mais graves, sendo que há ainda 29% de casos de gravidade intermediária.
De acordo com a pesquisadora do Instituto Sou da Paz, essa variação pode estar associada ao aumento da circulação de armas de fogo no país, derivada da flexibilização do acesso para a população durante o governo de Jair Bolsonaro. Ela sugere que internações desse tipo podem ser resultado de situações mais comuns, como em brigas, por exemplo, diferenciando-se de execuções. Além disso, a pesquisadora chama atenção para a região sul e centro-oeste, onde a porcentagem de acidentes é maior do que em outras áreas do país, regiões que possuem uma grande concentração de armas de fogo.
As agressões intencionais correspondem a 75% dos casos de ferimentos por arma de fogo em todo o país, enquanto os acidentes representam 17% das ocorrências. As regiões sul e centro-oeste são as únicas em que os acidentes estão acima da média nacional, com 32% e 26% respectivamente.
A pesquisa também revela que 9 em cada 10 pacientes internados por violência armada no Brasil são homens. Os jovens correspondem a pouco mais da metade das vítimas, e as pessoas negras representam 57% do total.
Segundo o Instituto Sou da Paz, a população negra é justamente aquela que mais sofre com um sistema de saúde deficitário. O estudo destaca que a disponibilidade de recursos humanos, como médicos anestesistas e cirurgiões, essenciais para o tratamento de casos de acidentes e violências nos hospitais do SUS, é menor nos estados onde a população negra tem maior representação.
Em resumo, os gastos com hospitalizações devidas a ferimentos por arma de fogo no Brasil são elevados e representam um desafio para o sistema de saúde. Apesar da redução nos últimos anos, os valores ainda são consideráveis, ressaltando a necessidade de políticas públicas eficientes para prevenir a violência armada e promover uma saúde pública mais equitativa.