Conflitos sociais e políticos desafiam a civilização brasileira, enquanto interesses poderosos tentam minar a reforma tributária

Os últimos dias têm sido marcados por intensos conflitos sociais e econômicos, que se manifestam através dos embates entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, entre os trabalhadores das empresas públicas e o plano de privatização do governo de São Paulo. Além disso, há disputas envolvendo terras, direitos de aborto e o uso de drogas. Enquanto isso, de forma discreta, empresas e profissionais de alta renda estão tentando derrubar a reforma tributária, buscando benefícios fiscais. Essa primeira grande reforma econômica, que afeta os mais ricos, está sendo prejudicada em detrimento do interesse geral.

A forma como esses conflitos estão se desenrolando revela que a civilidade do país está recuando no tempo. Esses embates não têm solução puramente técnica, embora a técnica, a pesquisa e o debate organizado contribuam para melhorar as decisões e discussões. No entanto, as decisões são essencialmente políticas, sendo tomadas através de força bruta, seja na Justiça ou no Parlamento.

Embora as posições a favor de mais direitos de aborto e uso de drogas sejam minoritárias no eleitorado, os partidos do agronegócio, da segurança pública e os evangélicos têm como objetivo implementar um programa fundamentalista, que não admite discussões. Eles procuram legitimar e fortalecer um sistema repressivo que tem consequências sociais terríveis e contraproducentes, como o aumento do número de mulheres mortas ou mutiladas, jovens presos (especialmente negros e pobres) e o fortalecimento do crime organizado, que se tornou uma instituição enriquecida e inserida na política.

No contexto da privatização, alguns setores da esquerda são contrários à iniciativa, pois defendem a intervenção estatal no controle das empresas. Outros acreditam que a prestação de serviços públicos será mais justa e ampla através das estatais. É fato que tanto empresas estatais quanto privadas podem prestar serviços de má qualidade. No entanto, realizar subsídios ou transferências sociais por meio de estatais é ineficiente em vários aspectos. Destinar recursos para esse fim nos orçamentos governamentais é mais adequado. No entanto, diante do cenário de orçamentos estourados e da alta carga tributária, a questão que se coloca é quem pagará a conta. Esse é um conflito político que deveria ser debatido em termos de eficiência, mas, por corporativismo, desinformação ou resistência às mudanças, não se quer ter essa discussão.

Se o problema é a necessidade do Estado para sanar a falta de investimento privado ou avanço tecnológico, então o debate é outro. No entanto, quem estaria disposto a discutir o financiamento de ciência e tecnologia, a universidade ou qualquer outra questão relacionada à falta ou distorção da oferta? Alguns países desenvolveram-se com a forte intervenção estatal, como é o caso da França, que não é um país pobre e possui um nível de renda semelhante ao do liberal Reino Unido, além de melhores condições sociais de vida. No entanto, a experiência estatal brasileira das últimas décadas, muitas vezes desastrosa e utilizada como meio de apropriação privada de recursos sociais, indica a necessidade de extrema cautela.

Em resumo, o conflito político atual tem se reduzido a um embate primitivo e selvagem. Isso ocorre, em parte, devido à falta de lideranças capazes de qualificar esse conflito, mediando-o com sabedoria. Estamos vivendo uma espécie de barbárie política que requer uma reflexão profunda e um maior engajamento das lideranças em prol do interesse geral da sociedade.

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